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Lenine

"Sou uma espécie de cronista sonoro do meu tempo"

Em 12/06/17 09:05.

Confira entrevista com o cantor Lenine, que se apresenta na UFG nesta terça-feira (13/6), no projeto Música no Câmpus

Silvânia Lima e Bruno Balduíno, Rádio Universitária da UFG

Da cidade do Rio de Janeiro, onde mora, e às vésperas de estrear em Goiânia o show Carbono, o cantor Lenine concedeu entrevista à Rádio Universitária da UFG. A apresentação faz parte do projeto Música no Câmpus e será realizada nesta terça-feira (13/06), às 20h30, no Centro de Eventos Professor Ricardo Freua Bufáiçal. Confira:

Esta é a sua segunda vez no Música no Câmpus. Por que escolheu esse projeto para lançar seu novo trabalho na capital goiana?

Isso deve-se muito ao fato de eu não ter apresentado em Goiânia o espetáculo homônimo a esse CD mais recente, que é o Carbono. Estive na cidade com outros shows. O Carbono consiste em todas as canções que compreendem o CD, mas também há no show um repertório que pincei de todos os discos, um pouco de cada projeto.

Em Goiânia, já fez algumas parcerias?

É uma coisa reiteradamente prazerosa. Tive uma relação também no universo mais acadêmico, com a Orquestra, então conheci muitos músicos. Qualquer banda, qualquer orquestra, qualquer ajuntamento, são músicos. É um universo coletivo e isso é o que dá uma característica, uma assinatura, a cada um desses ajuntamentos. Depois de tantos anos fazendo música, isso é uma das coisas mais bacanas para mim, que sou compositor dessas canções. É esse sentimento de maioridade que algumas dessas canções vão tendo. E tocar numa formação mais acadêmica, mais sinfônica, ou tocar com a minha banda que está há tantos anos comigo, muda muito, é como ver o filho vestido de diversas maneiras. Poderemos mostrar isso: as canções com esta roupagem de banda, desse coletivo, que é muito íntimo. Tenho gente como o Pantico Rocha, baterista, que está há mais de um quarto de século tocando comigo. Isso diz muito do som que eu faço.

Você mora há vários anos no Rio de Janeiro, mas não se desligou da música pernambucana e dos movimentos como o Manguebeat. Essa cultura ainda influencia seu trabalho?

Não sou tão bairrista assim. Defendo mais uma alma nordestina, que compreende várias regiões. A música regional não existe só em Pernambuco, é algo que vai do Piauí até o São Francisco. Existe uma alma que permeia toda essa região, uma "pan alma". E é nessa alma, nesse imaginário, nessa culturalidade que existe na região Nordeste, que me inspiro para fazer parte significativa das músicas. Evidentemente que fiz uma música como Leão do Norte, que se transformou quase em um hino do pernambucano e isso muito me envaidece e enche de orgulho, mas estou muito mais interessado nessa alma que é comum a muitos e tem a ver com toda essa região.

Para quem não lhe conhece ou não conhece a sua trajetória, quem é Lenine?

É um cara que faz umas músicas muito bacanas. Para dar uma leveza a esse questionamento, que é um questionamento muito sério, penso que faço um trabalho que é muito próximo do que você faz: tem a ver com reportagem. Só que o meu caminho de reportagem foi um caminho sonoro. E nesse sentido eu creio realmente que estou dando a minha versão dos fatos, a minha visão da história em cada disco que eu faço. Então isso é um ajuntamento de crônicas. Acredito que sou uma espécie de cronista sonoro do meu tempo.

Você está trabalhando com os seus dois filhos, o João Cavalcanti e o Bruno Giorgi. Além de tantas pessoas que você influencia, como é influenciar também os seus filhos e como é trabalhar ao lado deles?

É tão bom! Eles perceberam e vivenciaram o quanto não foi fácil para mim. Então têm uma noção muito clara do que é esse universo do entretenimento. Nem torci muito para que eles escolhessem esse caminho. Mas o tempo foi passando e cada um mostrou essa aptidão, esse desejo e esse prazer relacionado ao fazer música. Além do João e o do Bruno, tem também o Bernardo, que é o mais novo, que também é impregnado de música. É a melhor coisa do mundo poder dividir minha religião, que é a música e o palco, com os meus filhos. São sempre momentos cheios de significados para mim. Me dá uma sensação muito bacana, uma contribuição para o planeta muito mais efetiva do que qualquer disco que eu venha a fazer ou que já tenha feito.

Essa parceria com o Junior Tostoi também é importante?

Muito. O Junior, assim como o Pantico Rocha e como o Guila, são pessoas que estão comigo há muito tempo, são músicos que têm suas respectivas assinaturas e personalidades musicais. De alguma maneira, o trabalho que faço no palco é o somatório dessas assinaturas. É junto com o Guila, Junior Tostoi e  Bruno Giorgi que realmente executamos a música que faço. Quando gravamos um disco, é dentro de um ambiente mais asséptico, mais hospitalar, completamente diferente do que é um show, que é o momento em que você faz a música, de fato. É com essas pessoas que exercito a música mais única, a que acontece de imediato. Então são meus irmãos de caminho há muito anos. Tenho o Bruno que é filho, mas os outros são como gente da família escolhida. Nosso trabalho é muito familiar, no sentido desse coletivo, desse núcleo.

O álbum Chão, que é o anterior ao Carbono, experimenta bastante, principalmente na parte de  percussão, como uma percussão alternativa. Agora você voltou a usar percussão tradicional mostrando que cada CD tem características diferentes. Isso é proposital? Como é essa livre criação?

Evidentemente que existem, não regras, mas várias mecânicas para compor. E tem um grau de exigência que você se impõe para depurar aquilo que faz, da maneira como faz. É difícil porque é muito melhor tentarmos por em palavras o que se dá no campo do espiritual. Música, para mim, é algo que, no momento em que acontece, tudo tem outro tipo de sentido.

Você sempre teve liberdade autoral? Suas produções são independentes?

Todas. Sempre foram. Mas eu já vendi alguns projetos. Em mais de 30 anos, tem três projetos que não são meus. Então tem um viés independente nesse processo. Não foi acadêmico o aprender a fazer, eu tive que fazer, não tinha ninguém para fazer. Então descobri mecânicas para gravar melhor cada vez, o que acho que é uma coisa que tem que percorrer a carreira de cada um, independente de ser na arte, que é a busca de excelência. Você tem que buscar se aprimorar de alguma maneira. Percebo que isso tem acontecido na minha vida. Tenho cantado melhor, tenho tocado melhor. É como se fosse uma grande caderneta de poupança que você joga ali e aquilo vai rendendo juros, vai lhe dando uma permanência com excelência.

Para um artista o resultado da produção é também o resultado da experiência de toda uma vida. Você também é ecologista, já estudou Química, tudo isso reflete no seu trabalho, no Carbono, por exemplo?

Profundamente. Fizemos a taxa zero de carbono no projeto todo. Isso é uma questão que, não é que me aflija, mas que me preocupa. Ao longo da vida toda foi assim. Eu tenho grandes parcerias com grandes entidades como a SOS Mata Atlântica e o projeto Tamar, e mesmo fora do Brasil, como a Witness e o WWS, toda essa rapaziada, essa turma do bem, que está dando um exemplo para o planeta em questões que são fundamentais para o coletivo desse planeta. Isso eu acho que minha música tem isso agregado, está presente na minha música uma consciência mais humanista.

Qual a importância de um artista se manifestar politicamente?

Não existe música apolítica. É inevitável em tempos como esse que estamos vivendo. Mas, independentemente dessa inevitabilidade, questões de como viver na comunidade e como melhorar isso estão muito presentes como temas e como estímulos de minhas canções. Essa é uma cotação política que está muito presente nos meus trabalhos de maneira geral.

É a favor do movimento Diretas Já?

Eu falei isso há seis meses e todo mundo me achou um pouco louco, falou que era inconstitucional e agora está aí. Basta o Congresso querer. Agora, o Congresso vai querer? Que moral tem esse Congresso para querer alguma coisa em nome da gente? Acho muito boa e bem-vinda essa fratura exposta que o Brasil está sofrendo. Acho que precisamos passar por isso e não temos mais tapete para esconder a sujeira.

O carbono representa, na Química, basicamente a criação. As cadeias de carbono geram vários elementos. O que isso traz como conceito para o seu trabalho?

Mais que a concepção da vida a partir do carbono que nós temos, há uma característica do próprio elemento que talvez seja mais interessante e que me levou a usar essa palavra como título de um disco. É a alotropia, é o fato de ele poder se associar a qualquer tipo de coisa gerando outras moléculas com outras características, com outros sabores, outros paladares, outras equações. Isso, de alguma maneira, define o meu processo de criar, tem muito a ver com como eu faço. Quando quero gravar um disco, a primeira coisa que penso é em coisas que me emocionam, mas que nunca trabalhei e que quero ter ali junto naquele momento. Esse dado de pesquisa e de busca quase laboratorial permeia a minha vida e permeia o meu processo de fazer música. Isso está muito evidente. Cada vez que faço um disco é o maior momento de experimentação. Vai ser maravilhoso poder mostrar Carbono, já que esse é o último ano desse projeto. Até outubro estaremos nos despedindo desse projeto e já estou pensando em um projeto novo para o final do ano.

O que podemos esperar para o Música no Câmpus?

Um CD compreende 11 canções, um show é o dobro disso, no mínimo 22 canções. Não só o que compreende o CD Carbono, mas também músicas do meu repertório, uma ou duas de cada um dos meus discos. Então 50% do show vai ter canções que pincei de cada um dos projetos que tiveram essa exposição. Nos vemos logo!

Lenine

Fonte: Ascom UFG

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