
Ação de cidadania leva serviços à comunidade Kalunga
Iniciativa marca a quarta edição do Projeto Kalunga Cidadão, realizada em Monte Alegre de Goiás
Texto: Roseneide Ramalho
Fotos: Carlos Siqueira
Com o intuito de garantir acesso a serviços e promover cidadania, o último sábado (27/09) foi dedicado à realização de uma série de ações de extensão junto à comunidade Kalunga no município de Monte Alegre de Goiás, localizado no Nordeste goiano, a 450 km da Capital. Adultos e crianças quilombolas participaram de oficinas voltadas ao turismo, ciências, direito, saneamento básico e saúde animal, além de apresentação da política de inclusão da UFG e momentos de integração com as famílias e equipes que atuaram na iniciativa.
A ação integra a quarta edição do projeto Kalunga Cidadão, realizado pela UFG com a colaboração de professores e estudantes de graduação e pós-graduação. Neste ano, o projeto teve o apoio da Associação Quilombola Kalunga, Exército Brasileiro, Programa de Extensão Universitária do Ministério da Educação e Projeto Gado Curraleiro, que recebe incentivo da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás (Fapeg). A programação incluiu oito oficinas, com início às 9 horas e encerramento às 16 horas.
Ação mobilizou estudantes, professores e parceiros para a quarta edição do projeto Kalunga Cidadão
Equipes Multiprofissionais
A equipe de medicina veterinária realizou serviços de vacina, desverminação, consultas e castração de cães e gatos. Com mais facilidade de acesso, os atendimentos de cuidados com a saúde animal teve grande adesão. A estrutura foi montada na escola da região do Riachão, inclusive com centro cirúrgico. O senhor Arnaldo José dos Santos, 52 anos, aproveitou a oportunidade e levou o cachorro Pitoco de quatros anos para consulta veterinária. “Ele está sadio, mas trouxe para fazer medicação, caso precise”, disse.
Parte da equipe permanecerá no local até o dia 10/10, para ações de controle de zoonoses do projeto Gado Curraleiro, em que serão realizados exames no rebanho para identificar animais contaminados com tuberculose e brucelose, doenças que podem ser transmitidas para seres humanos. “Não tem custo e terão a certeza de que as famílias não ficarão doentes”, explicou Gustavo Lage, professor da Escola de Veterinária e Zootecnia (EVZ) da UFG. Os animais positivos para as doenças serão abatidos, mediante indenização aos proprietários.
Equipe da Escola de Veterinária da UFG realizou atendimentos a cães e gatos da comunidade
Mulheres e crianças participaram da oficina Memória e Identidade, com o objetivo de valorizar a cultura negra. Alunos do curso de Design de Moda e Direção de Arte, com acompanhamento psicopedagógico, ensinaram a produzir bonecas Abayomi, confeccionadas a partir de retalhos. “As escravas faziam essas bonecas com pedaços de tecidos para acalmar as crianças”, explicou a psicopedagoga Marilei Vidotte Plaza. Com a boneca em mãos, Eva Rodrigues Moreira, 33 anos, conta como foi participar da atividade. “Aprendi rapidinho. É fácil. Vou fazer para minhas sobrinhas”, comentou. O aprendizado na oficina também vai contribuir para diversificar os brinquedos de Quécia Fernandes Soares, 10 anos. “Brinco com bonecas de buriti. Agora vou brincar com essa”, revelou.
Oficina ensinou mulheres e crianças a produzirem bonecas Abayomi
Duas oficinas de Ciências foram promovidas pelo Instituto de Ciências Biológicas (ICB) da UFG. Direcionadas às crianças e mães quilombolas, foram utilizados experimentos para falar de forma prática sobre alimentação e cuidados com agentes tóxicos. “A primeira oficina é voltada para proporcionar uma alimentação mais saudável, com demonstração de como são compostas as refeições das famílias quilombolas. Já a segunda demonstra o efeito de substâncias como formol, metais pesados, drogas, entre outros no organismo. Utilizamos claras de ovos e mostramos como ela se submete às substâncias como o chumbo, por exemplo”, explicou o professor responsável pelas oficinas, Carlos Anunciação.
Experimentos mostraram na prática informações sobre alimentação e substâncias tóxicas durante oficinas de Ciências
O Instituto de Estudos Socioambientais (Iesa) da Universidade recebeu lideranças da região para oficina de Turismo. Com grande participação da comunidade quilombola, foram repassadas orientações sobre atrativos turísticos e meios de desenvolver o setor no local. Estudantes de graduação e pós-gradução da Instituto visitaram com antecedência a Região e produziram dois mapas que foram expostos aos participantes. Entre os mais interessados na oficina, estava João Batista de Aquino Santiago, 34 anos. “Temos muitos rios, cachoeiras, poços e festas que podem ser explorados e dar uma renda a mais”, avaliou. A opinião do quilombola é a mesma do doutorando Leonardo Ravaglia Ferreira Gonçalves, um dos ministrantes da oficina. “A região tem grande potencial. Recebemos a solicitação da comunidade para voltarmos. Vamos iniciar o planejamento para ministrar um curso de 40 horas”, afirmou.
Potencialidades turísticas foram abordadas em oficina ministrada com a presença de lideranças locais
A equipe do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) também esteve presente no projeto Kalunga Cidadão. Ao lado de dona Procópia dos Santos Rosa, 84 anos, pioneira na luta pelos direitos da comunidade Kalunga de Monte Alegre, o técnico do setor de regularização dos territórios quilombolas na Superintendência do Incra no Distrito Federal, responsável pela região, Ramon Chaves de Araújo, buscou esclarecer questões ligadas à regularização das terras quilombolas. “No momento, o Incra está retirando quem não é quilombola da área. Todos os procedimentos que o Incra está tomando é para garantir o direito à terra e para que os Kalunga fiquem aqui”, ressaltou. O técnico também apresentou as variações de posse de terra que existem no local e sugeriu que a UFG atue como facilitadora para discutir a questão do uso coletivo das terras.
O tratamento da água também foi abordado com a comunidade Kalunga. Estudantes de Engenharia Ambiental e Sanitária realizaram entrevistas com moradores sobre a infraestrutura em relação ao abastecimento de água, esgotamento sanitário e disposição de resíduos. Com intuito de multiplicar informações, professores que atuam nas escolas da região receberam cartilha sobre tratamento alternativo de água para consumo humano e para ações junto aos alunos. “Na cartilha informamos sobre como fazer um filtro alternativo e demonstramos na prática como ele pode ser feito. Além disso, sugerimos essa confecção como atividade de educação ambiental”, explicou o estudante Wanderson Willian Santos. A programação também incluiu consultoria jurídica com informações sobre consulta prévia, que é o direito que os povos tradicionais têm de serem consultados com antecedência sobre qualquer obra ou política pública a ser realizada em seu território. Questões sobre o Cadastro Ambiental Rural também foram discutidas.
Inclusão
A Pró-reitoria de Graduação (Prograd) realizou ação junto aos jovens da comunidade Kalunga de Monte Alegre para apresentação do Programa UFGInclui - destinado a promover a inclusão de alunos quilombolas e indígenas no Ensino Superior, preparando a comunidade para o Enem e ingresso na Universidade. Estudantes quilombolas da UFG relataram experiências e convidaram os presentes a tentar uma vaga na UFG e continuar os estudos. Ieda dos Santos da Silva, 21 anos, concluiu o Ensino Médio há um ano e pensa em fazer uma faculdade. “Não sabia dessa oportunidade. Ainda não escolhi o curso, mas agora posso correr atrás e me preparar", afirmou. Na ocasião, foram ainda distribuídos materiais com informações.
Estudantes quilombolas apresentam a política de inclusão da UFG e relatam experiência de cursar o ensino superior
Comunidade Kalunga
Os Kalunga são uma comunidade formada por negros que resistiram à escravidão e por outros, alforriados, que organizaram quilombos na região da Chapada dos Veadeiros, nos atuais municípios de Cavalcante, Monte Alegre de Goiás e Teresina de Goiás. As três cidades juntas formam o Sítio Histórico e Patrimônio Cultural Kalunga, que abriga a maior comunidade quilombola rural do Brasil, com uma área de mais de 230 mil hectares.
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Fonte: Ascom UFG
Categorias: Kalunga Cidadania Quilombola Kalunga Cidadão Última hora