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Mestres da congada ministram oficinas na UFG

Sur 05/12/12 00:02.
Irmandade do Rosário de Justinópolis (MG) compartilha conhecimentos com a comunidade universitária, em uma iniciativa da Faculdade de Educação Física

Patrícia da Veiga

Fotos: Wéber Félix

 

Passos em marcha, para frente, para trás. Seguem adiante como em uma procissão. Entoam, com a mesma força de pisar no chão, cânticos que saúdam Nossa Senhora do Rosário, São Benedito e São Sebastião. Esses pés se cruzam, encontram outros, em um vaivém que é, também, dança. Ao som da percussão, os movimentos ganham ginga e tornam-se, de quando em vez, brincadeira. Um apito diz a hora de iniciar e encerrar o canto. Vozes fortes mudam o tom da música que precisa ser, primeiramente, escutada, depois, cantada e dançada. Nessa toada, movimentos feitos por mulheres e homens nos ternos de Congo mantêm a tradição das irmandades dos santos pretos, em cuja constituição há um histórico de fé, resistência e luta.

 

De calças vermelhas, a capitã Maria Luiza Diniz Ferreira guia as marinheiras do terno de Congo da Irmandade do Rosário de Justinópolis (MG), que dançam e cantam ao som de instrumentos de couro e patangome

 

A congada não é somente uma manifestação cultural, mas, sim, a expressão da religiosidade e da trajetória de vida dos povos africanos, traficados e escravizados pelos europeus, e que, instalados na maior colônia portuguesa da época, desenvolveram suas redes de solidariedade, ou seja, as irmandades, à medida que o Brasil se constituía. Vem das irmandades um universo de signos identitários, mitos e memórias, do qual a educação formal pouco se vale, mas que em muito se relaciona com a cultura popular.

Foi por isso que nove integrantes da Irmandade do Rosário de Justinópolis (MG) estiveram na Faculdade de Educação Física (FEF) nos dias 30/11, sexta-feira, e 1°/12, sábado. Durante as oficinas e apresentações, eles ensinaram a estudantes e pesquisadores parte dos cantos, danças e brincadeiras que compõem suas festas. “No início fizemos um bate-papo e falamos dos princípios da Irmandade, de como surgiu. Pra quem não é do reinado e gosta do tema, é bom ouvir, saber dos fundamentos. Às vezes a pessoa gosta dos cantos, da dança, acha bonito, mas não sabe o porquê”, explicou Dirceu Ferreira Sérgio, capitão regente da Irmandade do Rosário de Justinópolis.

 

Dirceu Ferreira Sérgio, capitão regente da Irmandade adverte: é preciso compreender o sentido da congada

 

As oficinas consistiram na explicação dos rituais existentes em dois ternos: Congo e Moçambique. São procissões que reproduzem o momento em que Nossa Senhora do Rosário foi encontrada por marinheiros nas águas do mar. A santa, a partir de então, teria passado a viver junto dos escravos e a protegê-los dos açoites da vida. Há quem diga que os brancos a levaram, mas ela voltou para o lugar de seu povo. Frequentemente, as irmandades se consolidam por meio dessa experiência e fundam seus ternos para conduzi-la e festejá-la.

A Irmandade Nossa Senhora do Rosário realiza três festas anualmente: em janeiro é feita a homenagem a São Sebastião, em maio é comemorada a Abolição da Escravatura, com louvor a São Benedito, e em outubro é feita a celebração a Nossa Senhora do Rosário. “Essa é a festa do reinado maior. Vai gente de todos os lugares e de outras irmandades. São 13 dias de encontro, com uma novena, e mais quatro dias de dança e canto”, complementou Dirceu.

Grosso modo, é possível dizer que o reinado anunciado por Dirceu representa a importância desse povo que abrigou Nossa Senhora do Rosário. Certamente, muitas pessoas entre os povos africanos trazidos à força para a América eram reis e rainhas em suas terras. Suntuosos e exaltados por seu povo, carregavam consigo a incumbência da representação divina. Por isso, cada irmandade resgata essa ancestralidade, que designa para as famílias a continuidade da fé e da tradição, a continuidade da importância de sua gente. O reinado é da santa e também de quem integra essa rede de proteção. A Irmandade do Rosário de Justinópolis, do alto de seus 123 anos, está na sétima geração de seu reinado.

Professora Renata Lima, coordenadora do programa Corpopular, da FEF, faz às vezes de cicerone da Irmandade nos espaços da universidade

 

A iniciativa de convidar os congadeiros para a UFG foi do Corpopular – Intersecções Culturais, um programa de extensão coordenado pelo Laboratório de História e Artes do Corpo (Velhaco), da Faculdade de Educação Física e Dança (FEF), coordenado pela professora Renata Lima. De tempos em tempos, o programa realiza atividades sobre jongo, samba de roda, afoxé, capoeira, congada, cavalo marinho e outras manifestações vinculadas à cultura popular. Para tanto, convida diversos atores sociais para colaborarem e serem co-organizadores dos eventos. Já participaram do Corpopular, por exemplo, mulheres da Capoeira Angola, ternos de Congo de Goiânia e artistas de diversas partes do país.

No fim da tarde de sexta-feira, com uma pancada de chuva armando no céu e o tempo esquentando na terra, o clima na FEF era de integração e de reconhecimento da cultura e da sabedoria populares. Durante a apresentação do terno de congo, as pessoas acompanharam o ritmo dos tocadores de caixa e patangome, capitãs e marinheiras, seguindo os passos que aprenderam.

 

Comunidade universitária acompanha o ritmo da congada, com a Irmandade do Rosário de Justinópolis

Source: Ascom/UFG

Catégories: Cultura

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