Crise de participação ou de representação?

Sur 01/10/12 00:19.
Debate sobre voto nulo procurou entender o atual grau de insatisfação dos goianos com a política

Anamaria Rodrigues

Nesta última quinta-feira (27/9) o Núcleo de Direitos Humanos (NDH) da UFG, em parceria com o Comitê contra a Farsa Eleitoral e com o Programa de Mestrado em Ciências Políticas da UFG, realizou mais uma edição de seu Ciclo de Debates com a temática “Voto nulo – crise de participação ou representação?”, no Salão Nobre da Faculdade de Direito, localizado na Praça Universitária.

A temática do voto nulo vem sendo bastante abordada pela mídia desde que o Instituto SERPES divulgou que o número de eleitores em Goiânia que pretendem votar nulo ou não votar ocupa o segundo lugar das intenções de voto. Em todo o estado, esse porcentual de eleitores que declararam votar nulo só não é maior do que o resultado encontrado em Aparecida de Goiânia. O voto de protesto ou o boicote às eleições é o resultado da insatisfação do cidadão goiano com o sistema político vigente, um assunto de extrema preocupação e que precisa ser discutido. Foi com esse objetivo que os professores Pedro Célio Alves Borges, da Faculdade de Ciências Sociais (FCS), e João da Cruz, da Faculdade de Direito (FD), realizaram um debate procurando discutir os pontos negativos e positivos do voto nulo. A mediação foi da professora Helena Esser, da Faculdade de Filosofia (Fafil).

 


Banca de debate: da esquerda para a direita, Pedro Célio, mediadora Helena Hesser, e João da Cruz

 

O primeiro a assumir a palavra foi o professor Pedro Célio, que inicialmente realizou uma retrospectiva histórica mostrando os principais momentos do voto nulo na história. Segundo ele, o auge desse voto de protesto deu-se durante o período da ditadura militar, mais especificamente nas eleições de 1970. Foi um momento em que as eleições eram cercadas por um certo sentimento de descrédito em relação aos resultados eleitorais, uma vez que esses não transformariam por completo o sistema politico. Votando nulo, estariam desmoralizando o regime.

Pedro Célio afirma que a situação atual não é a mesma. Atualmente o sistema politico está aberto e estruturado de maneira democrática, possibilitando a participação dos indivíduos na política. Para o professor, o voto nulo pode significar o rompimento do indivíduo com esse direito, a opção pelo isolamento e pelo reforço da individualidade no sistema político. "Do ponto de vista moral", explicou o professor, "significa não dialogar mais com aqueles que não falam o meu idioma, que não concordam comigo, então eu deixo de me comprometer, perdendo assim, consequentemente, o direito de cobrança”.

 


A plateia se interessou pelo tema do voto nulo e compareceu em peso ao Salão Nobre da Faculdade de Direito

 

Segundo Pedro Célio, se o protesto não possui uma finalidade objetiva e estratégica, perde o sentido, ou então pode voltar-se contra si próprio. “O voto nulo pode significar um tiro no pé e o reforço daquela mazela que se quer denunciar. As campanhas do voto nulo hoje podem agradar tremendamente os candidatos que estão na frente das pesquisas, ou seja, diminuindo o universo total de eleitores, menor é a chance de tirar a diferença de quem está na frente”.

O professor João da Cruz tomou a palavra em seguida explicando que, para se falar da crise que o sistema político vive hoje, é preciso falar de "farsa eleitoral". Segundo ele, essa farsa seria um jogo representacional, uma construção fictícia da vontade popular. O povo não é representado, “são mais representações dos interesses pessoais do que público. Há uma instalação remota do poder social”, afirma João da Cruz.

Essa farsa só ocorre porque não existe mobilização. A exaustão psíquica causada pela competição econômica constante, a partir da década de 1990, e o fato de os partidos não representarem mais as opções políticas, reduzindo os discursos a opiniões, são uns dos possíveis fatores que levaram a essa não-mobilização e possível descrença. João da Cruz afirma que é preciso reaver a vontade de lutar, ir às ruas e criar força por meio de protestos. O voto nulo é uma forma de chamar a atenção pública e, dessa forma, alertar para um sentido de mudança. “É um gesto simples, mas que causa um impacto no imaginário público”, afirma o professor.

Source: Ascom/UFG