Lições com mestres da medicina popular
Marina Celestino
Entre os inúmeros produtos e serviços trazidos por comunidades e cooperativas de todo o estado à Agro Centro-Oeste Familiar, houve especial atenção para as plantas com propriedades medicinais encontradas no Cerrado. Xampus, cremes corporais, sabonetes e mesmo temperos feitos artesanalmente com o uso dessas plantas estão em exposição nos estandes das cooperativas de municípios como Canudos, Piracanjuba e Sanclerlândia.
Entre esses expositores o destaque foi o senhor João Vicente da Costa, convidado pela professora Maria Elisa Borges, do Instituto de Ciências Biológicas (ICB). Único representante do município de Sanclelândia no evento, ele deu palestras e realizou demonstrações de como preparar remédios caseiros. Descendente de duas tribos indígenas, ele adquiriu todo o conhecimento sobre os remédios da natureza pela tradição oral passada pela família de geração a geração.
Frequentemente convidado para dar palestras em escolas e universidades, Seu João, como é conhecido, sabe preparar chás, remédios e infusões com cerca de 5 mil espécies da flora do cerrado, conhecimento que detém apenas pela memória. Durante sua palestra, ele mostrou como preparar a espuma do cipó-fogo, planta encontrada na mata ciliar, com efeito analgésico e antibiótico sobre queimaduras de todos os graus, além de garantir uma cicatrização sem sinais na pele.
De acordo com Seu João, conhecer as plantas e ervas não é suficiente, é preciso saber preparar os chás e remédios. “Os assentamentos e comunidades têm imenso potencial de conhecimento medicinal não explorado. Seria preciso a criação de programas que levassem essas pessoas para dentro das universidades, unindo a sabedoria popular e o estudo da ciência”, afirmou ele.
Outro problema identificado por ele é a comercialização desses produtos por empresas e pessoas que não têm o devido conhecimento acerca de suas propriedades. “O local onde a planta é colhida, o horário do dia em que isso acontece e o preparo do remédio com a planta ainda fresca são essenciais para que o efeito seja o esperado. Chás que já vêm empacotados, por exemplo, têm as plantas secas há muito tempo, muitas vezes colhidas e misturadas sem rigor ou higiene”, declarou.
Secretário do Meio Ambiente de Sanclerlândia como voluntário, Seu João também atua como farmacêutico, aplicando sua sabedoria sobre os remédios naturais quando procurado por moradores que não têm condições de bancar o sistema médico tradicional. Abordando o problema da falta de comunicação entre conhecimento popular e conhecimento acadêmico, ele conta que escreveu um livro, mas sem perspectiva de publicação. "Escrevi o livro à mão. Já useis três resmas completas de papel. Meu grande sonho era conseguir a publicação e deixar o legado de pelo menos mil plantas que conheço e seus usos terapêuticos", disse ele.
Fonte: Ascom/UFG
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