Trabalho de Hugo de Carvalho Ramos é revisitado
Seminário celebra cem anos da primeira publicação de Tropas e Boiadas, do escritor goiano
Texto: Patrícia da Veiga
Fotos: Carlos Siqueira
A Faculdade de Letras da Universidade Federal de Goiás (FL) realizou nestas segunda e terça-feira (4 e 5/12), no Cine UFG, uma série de debates acerca do livro Tropas e Boiadas, do escritor goiano Hugo de Carvalho Ramos. A iniciativa celebrou o centenário da publicação, que teve uma primeira versão em 1917, pela Editora Revista dos Tribunais (Rio de Janeiro). Na oportunidade, pesquisadores discutiram o contexto da obra, suas interfaces e sua inserção na literatura nacional. Houve, ainda, lançamento de uma edição especial impressa pelo Centro Editorial Gráfico (Cegraf).
Plateia acompanha palestra sobre Tropas e Boiadas no Cine UFG
Tropas e Boiadas é uma coletânea de contos que retrata o sertão goiano com toda a sua violência – ora explícita na truculência dos coronéis e nas consequências da escravidão, ora contida nos costumes, na religiosidade, na conduta das personagens. Para Luiz Dagobert de Aguirra Roncari, professor da Universidade de São Paulo (USP) convidado a ministrar palestra no Seminário Cem Anos de Tropas e Boiadas, Hugo de Carvalho Ramos apresenta duas vozes que não se conciliam: uma que apresenta as perspectivas da região para os leitores da cidade, de forma descritiva e apelando para o pitoresco; outra que escancara as “deformações republicanas” do local para seus próprios conterrâneos, em tom de denúncia. “São vozes justapostas que não se resolvem em uma unidade formal, estão seccionadas”, avaliou.
Para o professor, a ambiguidade é uma das marcas de Tropas e Boiadas. “Quando o autor fala da autoridade exacerbada e da escravidão por dívida, por exemplo, deixa passar um aspecto crítico muito forte. Ao mesmo tempo, trata a violência e consequente passividade com certa normalidade e isso nos espanta”, defendeu Roncari. A propósito, o professor destacou que a justiça (ou falta dela) é um tema tangente ao texto de Carvalho Ramos e à literatura regionalista como um todo, o que os torna atual. “O sertão é retratado como a ausência do Estado, onde a lei e a justiça estão submetidas aos desmandos dos coronéis, onde o poder privado prevalece. Nesse sentido, o Brasil virou 'sertão' novamente e o caráter normal da violência de Tropas e Boiadas revela muito sobre a constituição de nossa sociedade”, observou.

Luiz Dagobert de Aguirra Roncari, da USP, e Renata Rocha Ribeiro, da FL/UFG
Durante a abertura do Seminário, o professor fez uma análise da relação entre campo e cidade presente em Tropas e Boiadas e também em textos como Os Sertões (1902), de Euclides da Cunha, e Minha Vida de Menina (1942), de Helena Morley – pseudônimo de Alice Dayrell Caldeira Brant. Para o professor de literatura, estabelecer paralelos entre tais trabalhos é um exercício possível uma vez que se referem, com visões diferentes, a um mesmo período histórico: a Primeira República ou República Velha (1889 a 1930). Também participaram como convidados do Seminário os professores Marcos Lucchesi, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Albertina Vicentini, da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO), Luiz Gonzaga Marchezan, da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Araraquara, Luís Bueno, da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e Maria Amélia Garcia Alencar, da Faculdade de História da UFG.
Vida e obra
Hugo de Carvalho Ramos nasceu em 1895 na cidade de Goiás, onde passou a infância e o início da juventude. Aos 15 anos iniciou suas atividades intelectuais, publicando artigos e poemas em jornais goianos. Mudou-se para o Rio de Janeiro em 1912, com a intenção de conhecer personalidades da literatura que admirava, tais como Coelho Neto e Olavo Bilac. Estabeleceu-se como estudante e escritor, muito inspirado, também, por Euclides da Cunha. Com a publicação de Tropas e Boiadas, recebeu proposta de Monteiro Lobato para se dedicar a uma segunda versão da coletânea de contos. Gente da Gleba, seu conto mais extenso e um dos mais emblemáticos, dividido em 12 partes, foi publicado na íntegra somente a partir da segunda edição. Iniciou a faculdade de Direito em 1915 e faleceu seis anos depois.
Seminário Cem Anos de Tropas e Boiadas despertou a atenção de pesquisadores
Fonte: Ascom/UFG
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